Experiências estéticas e femininas no livro “Era uma vez”

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Tente transportar-se para terras longínquas no Oriente, por volta de 800 a.C.. Sinta o cheiro das especiarias, permita-se conhecer uma narrativa que garantiu a vida.

Maria Tereza Andruetto nos surpreende com seu livro Era uma vez, acariciado pelo toque harmonioso das ilustrações de Claudi Legnazzi. O inexplicável talento da autora nos convida a delirarmos no mundo mágico das mil e uma noites, clássico árabe provavelmente escrito entre o século XIII e XVI que ainda hoje perpetua. Quem nunca se encantou com Sherazade e suas narrativas?

Este clássico está presente no inconsciente coletivo da humanidade, recheado de arquétipos, símbolos, sabedoria e da sutileza de uma mulher que depende de uma rede de cúmplices para garantia de sua vida.

Os encantamentos de Sherazade marcam a necessidade de significar-se através do ato de narrar. Mais uma vez a literatura extrapola todos os limites, fazendo-nos perceber sua importância desde os tempos mais remotos.

A autora evoca de forma sutil a perspicácia feminina, através de uma narrativa circular, que garante a audiência do leitor cada vez que uma nova história começa. A cada trama mais um dia da vida de Sherazade é conquistado.

Andruetto retoma características femininas como o mistério, a sabedoria, e a inteligência. Cada mulher apresentada constrói um pacto, garantindo que o grão-vizir se interesse por uma nova história.

O mesmo movimento que o grão-vizir faz a espera de uma nova narrativa, o livro nos leva a fazer. Esperando encontrar o desfecho do enredo, quem lê vai adentrando o livro mantendo um ritmo garantindo que o leitor não desista de escutar mais um pouco.

A estruturada narrativa leva o leitor a se transportar para algum país e em cada um deles uma mulher conta um novo conto. A chave está em iniciar uma nova história pela antiga narradora.

Não há dúvida que a ilustração assume papel primordial para construção do livro, cada arabesco, pintura detalhada, traz a representação da feminilidade em seu potencial. As ilustrações são em página dupla e representam um país e uma mulher, proporcionando uma experiência estética diferenciada.

Mesmo com toda sutileza apresentada pelo texto e pela imagem a autora nos diz “Fazia muito tempo que o grão-vizir a havia feito sua prisioneira e esperava apenas pelo momento apropriado para matá-la”.

O desejo de matar Sherazade foi passando e o grão-vizir se viu fascinado pelas histórias contadas. Mesmo prisioneira, a esperança de encantar seu amo faz com que todas: Saláh, Ghuta, Sura, Anú e Sherazde, com suas diversas qualidades, formem a teia de “Contos de mulheres que contavam contos”.

Cada partícula do livro é poética. Desde as guardas, que nos remetem aos jardins dos grandes palácios árabes, até a conclusão da história num arabesco que reporta a fecundidade feminina, em que se diz “E, nesses contos, viveu para sempre” como se daí a vida desse frutos.

“Era uma vez” encanta por suas sutilezas, uma obra rica em que nos é proposta novas experiências literárias e estéticas. Uma verdadeira homenagem ao poder das histórias para humanidade.

Autores: Maria Teresa Andruetto e Claudia Legnazzi
Editora: Casa Amarelinha
ISBN: 9788566637021
Idioma: Português
Ano de Publicação: 2013

 
 
 
 


Imagem: Ilustrações de Claudia Legnazzi, Era uma vez, Casa Amarelinha, 2013


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  • José Paulo Ferreira dos Santos

    Professor da Rede Municipal de Educação de São Paulo, trabalhou como orientador de Sala de leitura. Pós-graduado em Psicopedagogia. Atualmente trabalha na coordenação pedagógica do CIEJA Profª Rose Mary Frasson e está finalizando a especialização em Livro, Crianças e Jovens: Teoria, Mediação e Crítica pelo Instituto Vera Cruz.

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