Um papo com Guilherme Karsten

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O ilustrador brasileiro Guilherme Karsten chega ao fim de 2019 muito feliz. E não é para menos. Entre outubro e novembro, ganhou dois importantes prêmios internacionais: o BIB Plaque, da Bienal Internacional de Ilustração da Bratislava, e o Golden Pinwheel, da Feira Internacional do Livro Infantil da China.

O destaque é o livro Aaahhh!, o segundo que assina texto e ilustração, recém-lançado na Inglaterra e com edição brasileira para o começo de 2020. Carona, seu primeiríssimo livro – que já foi editado na França e deve sair aqui no ano que vem.

“Não imaginava ser premiado em qualquer um deles. É um pouco estranho, de uma forma positiva, pois eu sempre estive atento a ganhadores destes concursos, pesquisava sobre esses artistas, apreciava suas obras e sempre os considerei minhas referências. Agora meu nome está incluído no hall de vencedores. É incrível”.

Natural de Blumenau, cidade catarinense onde mora com a esposa e os filhos pequenos, conta que tem uma vida tranquila, rotineira: leva as crianças pra escola e vai para o trabalho; almoça com elas e retoma o trabalho; às 18h30 já está em casa.

Desenha desde que se entende por gente, mas não acreditava que seria uma boa profissão. Tanto que aos 18 anos descartou sua pasta de desenhos, seus melhores trabalhos, garante. Só anos mais tarde entendeu que essa era sua profissão, acumulando experiência em projetos na área da moda e design editorial. O primeiro livro ilustrado foi Mãenhê, com textos do Ilan Brenman, dando início a uma parceria que resultou em muitos títulos.

Finalista do Prêmio Jabuti e do Nami Concours, na Coreia do Sul, ambos em 2018, menção honrosa no Planeta Tangerina de 2017, em Portugal, recebeu o selo Cátedra 20 da Unesco, também em 2017, e venceu o concurso de novos ilustradores da Livraria da Vila, em 2010.

Neste papo com a Revista Emília, Karsten fala sobre livros e ilustrações, seu processo criativo, planos para o futuro e, é claro, os novos prêmios.

Priscilla Brossi Já consegue dimensionar os impactos desses novos prêmios em sua carreira?

Guilherme Karsten – Recentemente, participei de um evento em que grandes autores e ilustradores palestraram. Tinha acabado de ser premiado em Bratislava e ver esses artistas me parabenizando, conversando como pares é muito legal. Ser reconhecido pela comunidade do livro traz o sentimento de que o esforço valeu a pena. Ainda não consigo mensurar, mas meus editores, no Brasil e fora, estão muito contentes com esses resultados, sabem da importância dos prêmios e o peso que dão ao meu currículo. Minha agente literária vez ou outra comenta que meu nome vem sendo citado no exterior. Isso é demais! Vamos ver como será daqui pra frente.

PB – Poderia contar como foi o processo de escrita e ilustração de Aaahhh!, seu segundo livro?

GK Aaahhh! é um livro muito especial. Difícil comentar sobre o processo sem dar spoiler do roteiro. Após escrever Carona, estava em busca de uma nova história. Tenho na cabeça que as histórias estão por aí e é preciso sensibilidade, repertório e capacidade de olhar os acontecimentos por diferentes ângulos. Foi aí que aconteceu. Ouvi um berreiro no prédio onde moro, eu estava na garagem e comecei a subir as escadas, indignado com o vizinho que deixara seu filho berrar daquele jeito, que afronta! Quando abri a porta do meu apartamento, notei que era meu filho mais velho, não queria ir pro banho… surgiu assim. Aumentei um pouco os fatos e mudei o final, com a ajuda de um amigo também autor, o Pablo Lugones.

Aí foi sentar, redigir, revisar. Revisei o livro muitas vezes, recebi vários conselhos de amigos sobre partes do texto que não estavam boas e, depois de tanto lapidar, finalizei e iniciei o processo de ilustração. Esta parte é muito interessante, digo isto porque sinto que é o meu campo predileto (escrever é coisa nova pra mim, mas ilustrar não) e por vezes tenho crises antes de iniciar um novo projeto. Sempre quis ter um estilo único, onde todos pudessem me reconhecer, como o Ziraldo, a Mariana Massarani etc. Mas confesso que após a feitura de um livro, não aguento mais aquele estilo e parto pesquisar novas ideias, tendências etc. Foi assim com o Aaahhh!, minha primeira experiência com colagens, misturando a minha ilustração.

Outra coisa que sempre me interessa são os títulos. Aaahhh! é um nome difícil de pesquisar no google, difícil de expressar e mesmo assim me interessava muito, dizia tudo e não se entende nada ao mesmo tempo, passou no meu teste.

PB – Aaahhh! ganhou uma edição fora do país antes de ser publicado aqui. Por quê? Terá uma edição brasileira?

GK – O livro na versão brasileira é da Harper Collins, já estava impresso mas a publicação foi adiada, pois um clube de leitura comprou algumas cópias para lançar com exclusividade. Acredito que em janeiro de 2020 ele estará nas livrarias pelo Brasil. Nesse meio tempo, a Thames & Hudson (Inglaterra) comprou direitos e logo publicou, uma edição primorosa.

PB Antes de seus dois livros, você ilustrava autores, especialmente os textos de Ilan Brenman. Como tem sido essa parceria?

GK – O Ilan é um cara muito especial pra mim, um grande amigo e conselheiro, que me abriu muitas portas. De tanto conviver com ele e com outros autores, acabei virando um escritor também. Nossas reuniões são divertidas, viajamos com ideias, é bacana. Perdi a conta de quantos livros ilustrei pra ele. Ainda tem mais alguns chegando, outros ainda para serem ilustrados. Além disso, nossa parceria está ganhando alguns países novos. A recepção tem sido boa.

PB Poderia contar como é seu processo criativo?

GK – Meu processo criativo para cada novo projeto começa com pesquisas aleatórias em sites e aplicativos como Instagram, Pinterest etc. As imagens que vejo são ideias, contam histórias. Crio uma pasta com as referências que me interessam e começo a rabiscar, geralmente no computador por conta da praticidade. Quando finalizo a primeira ilustração, no fim do dia, envio para minha esposa ver. Me pego olhando para a arte criada em casa, antes de dormir, sempre acho que ficou muito ruim. No dia seguinte, arrumo ou até refaço e, depois que chego a uma identidade visual que me agrada, parto para as páginas.

Tenho sério problema com layouts, não gosto de fazê-los, apenas faço rabiscos com marcações e vou direto para a ilustração final. Isso às vezes gera um baita retrabalho, mas não adianta, meus layouts não me agradam.

PB Acompanha o trabalho de outros ilustradores? Brasileiros? Internacionais?

GK – Acompanho, muito. Tantos brasileiros como internacionais. É muita gente pra lembrar agora, mas no Brasil me identifico com o Roger Mello, o Andrés Sandoval, o Jean-Claude Alphen, Alexandre Rampazo, Renato Moriconi, essa turma tem o pensamento lá na frente. Me sinto sempre correndo atrás pra tentar alcançar o raciocínio deles. Olhando pra fora tem a Beatrice Alemagna, Joo Hee Yoon, Jon Klassen, Chris Haughton , André Letria, Catarina Sobral, Planeta Tangerina, Oliver Jeffers etc. Mas tem muito mais, muito mais…

PB E seus futuros projetos?

GK – Claro, Aaahhh! e Carona serão lançados no Brasil em 2020. Estou empolgado com isso. Divulgo estes livros há muito tempo, mas as pessoas não conseguem encontrar o livro nas livrarias. Finalmente vão chegar. Além do Brasil, França e Inglaterra, eles também serão publicados na China, Coreia do Sul e Turquia.

Interessante, sempre tive como meta estender a publicação dos meus livros para fora do Brasil. Um desejo pessoal, como uma chancela de qualidade do meu trabalho ao redor do mundo. Coincidentemente, meu primeiro livro, Carona, foi primeiro publicado na França, pela Le Seuil Jeunesse, apesar de já estar quase pronto para sair aqui no Brasil, pela Companhia das Letrinhas.

Além desses, tem um livro que me deixou muito feliz com o resultado, chama-se Uma Canção, está pronto e será publicado no Brasil pela Harper Collins. É uma história bonita que dedico ao meu pai, só de lembrar meus olhos marejam. Estou planejando um lançamento bem bacana para o livro, a cabeça está a mil.

Tenho outros livros na pauta para ilustrar, uma agenda bem cheia. Além disso, algumas histórias que ainda precisam ser escritas e ilustradas.

É pouco tempo para muita ideia e muita ideia pra uma cabeça apenas.


Imagem: Ilustrações de Guilherme Karsten, para os livros Aaahhh! e Carona.


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  • Priscilla Brossi Gutierre

    Jornalista com experiência em gestão de projetos de comunicação. Especializada no desenvolvimento de estratégias de conteúdo editorial, incluindo planejamento, edição, curadoria e redação, para diferentes formatos e mídias. No Instituto Emília, atua no plano de relacionamento com a imprensa e edita a newsletter mensal. 


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